Os ovos fazem mal ao coração? Afinal diminuem o risco de AVC? Então em quê que ficamos? Somos frequentemente bombardeados com informação contraditória sobre este tema pelo que pode ser difícil ter uma opinião formada. Neste sentido, neste artigo tentamos rever o que a ciência nos diz presentemente.
O Ovo
Durante muito tempo, o ovo foi encarado como um vilão
devido ao seu alto teor de colesterol. De facto, é verdade que 1 gema grande
tem cerca de 200mg de colesterol, tornando-o uma das fontes mais ricas de
colesterol alimentar. Contudo, este alimento também contém outros nutrientes
que podem ajudar a diminuir o risco de doença cardíaca. Além disso, outro ponto
a favor do ovo é que a quantidade moderada de gordura num ovo (aproximadamente
5g) é maioritariamente monoinsaturada e polinsaturada.
Os ovos são ricos em:
Colesterol
Proteína
Colina
Biotina
Vitamina A
Antioxidantes luteína e zeaxantina
A imagem abaixo ilustra os valores nutricionais por 100 gramas ovo de galinha inteiro (cru), sendo que 1 ovo médio pesa entre 50-60 gramas, aproximadamente.
Em primeiro lugar, é necessário enquadrar esta polémica.
Antigamente, pensávamos que uma dieta rica em colesterol aumentava o colesterol
no sangue (um fator de risco para as doenças cardiovasculares). No entanto,
hoje sabemos que o colesterol dos
alimentos tem pouca influência no do sangue e que, para a maioria das
pessoas, as gorduras saturadas na dieta
(ex: carnes vermelhas, manteiga, queijo) e gorduras
trans (presente em alimentos processados como bolachas, ect.) influenciam mais o nível de colesterol
no sangue.
Além disso, parece que o consumo de até 1 ovo por dia não está associado a
aumento do risco de doença cardiovascular em indivíduos saudáveis(com base em 2
grandes estudos prospectivos cohort que incluíram quase 40 000 homens e
mais de 80 000 mulheres). Por outro lado, importa ressalvar que isto
não significa que o seu consumo descomedido seja aconselhável, especialmente
para pessoas com diabetes mellitus ou alto risco de doença cardíaca.
Como sempre, é fundamental olhar para o contexto de toda a dieta, e não para para
os ovos isoladamente: não é possível comparar um ovo estrelado, frito em óleo,
acompanhado por salsichas e bacon com
um ovo cozido acompanhado por 1 fatia de pão integral, por exemplo. Infelizmente,
em alguns estudos tal não é tido em consideração, pelo que temos que ter
cuidado ao interpretarmos as suas conclusões.
Mais, ter uma
visão global também implica atender aos alimentos que iriam substituir os ovos.
Por exemplo, os ovos serão uma melhor opção que produtos ricos em açúcar e
cereais refinados (como cereais de pequeno-almoço adocicados, panquecas com
calda ou bolos). Num cenário oposto, uma taça de aveia com algumas nozes e
frutos vermelhos, por exemplo, poderá ser uma escolha melhor em termos de saúde
do coração. Isto porque o consumo de
cereais integrais e frutas prediz um menor risco de doença cardíaca, e quando
se trata de proteína, fontes vegetais (como nozes e sementes) estão
relacionadas com uma menor mortalidade cardiovascular e global, especialmente
quando comparada à carne vermelha e ovos.
Assim, com base no que sabemos hoje, para aqueles que
querem seguir uma dieta saudável, manter a ingestão
moderada de ovos será melhor para a maioria.
Conclusão:
Os ovos são uma boa fonte de proteína e não elevam muito o colesterol no sangue. Alimentos ricos em gorduras trans e gorduras saturadasafectam mais os níveis de colesterol sanguíneo do que os ovos.
Assim, caso goste e deseje, consumir até um ovo por dia não parece aumentar o risco de doença cardiovascular. Para pessoas com diabetes e doença cardíaca, por exemplo, é especialmente aconselhável não comer mais do que 1 gema por dia.
Tem-se vindo a falar cada vez mais sobre a vitamina D – a vitamina do sol – por algumas vezes descrita como a solução de inúmeras doenças – mas o que nos diz a ciência hoje?
Onde se encontra a vitamina D?
A vitamina D é produzida sobretudo na nossa pele pela ação da luz solar, mais especificamente dos raios ultravioleta B. A quantidade produzida pelo nosso organismo depende de vários fatores (ex: o tipo de pele e a sua pigmentação, a superfície da pele exposta, o uso de protetores solares, a hora do dia, a estação do ano, ect.). Em determinadas condições, a vitamina D pode ser sintetizada pelo nosso organismo em quantidades suficientes. Por exemplo, uma exposição solar dos braços e pernas por 5 a 30 minutos poderá atingir as necessidades.
Além disso, esta vitamina também pode ser obtida através de alguns alimentos- principalmente peixes gordos (ex: salmão, atum e cavala) e óleos de peixe, mas também fígado bovino, queijo e gemas de ovos – ou pela suplementação vitamínica. Em algumas áreas geográficas (ex: Estados Unidos da América, norte da Europa) a vitamina D também está disponível nos mercados em alimentos fortificados, como leite, cereais de pequeno-almoço e pão. Em Portugal existem no mercado vários suplementos vitamínicos contendo vitamina D.
Porque precisamos desta vitamina?
É indiscutível
que a vitamina D tem um papel primordial no metabolismo do cálcio – é uma das
hormonas responsáveis por manter os níveis de cálcio no sangue (ao promover a
absorção de cálcio e fósforo a partir do intestino
e a reabsorção óssea de cálcio). Nas
situações de insuficiência crónica de vitamina D, pode ocorrer perda de massa
óssea e risco aumentado de fracturas por traumatismos de baixa energia. Assim, sabe-se que é essencial manter
níveis adequados de vitamina D para conservar a saúde óssea ao
longo da vida, e em particular nas mulheres pós-menopáusicas e idosos, nos quais a osteoporose é mais
prevalente.
Por outro lado, nos últimos anos temos ouvido falar cada vez mais de possíveis benefícios da vitamina D noutros contextos clínicos (como por exemplo, na prevenção de cancro e doença cardiovascular). Consequentemente, têm havido cada vez mais solicitações para dosear esta vitamina no sangue, assim como dúvidas em relação ao benefício na sua suplementação.
Antes de aprofundar, queríamos relembrar que:
Infelizmente, como sabemos, nem toda a informação que lemos é igualmente relevante, corretamente interpretada ou justamente publicitada de acordo com a sua importância. Neste sentido, é essencial aprender a filtrar a informação:
Em primeiro lugar, é necessário alertar que existem diferentes tipos de estudo e que temos que ter cuidado ao tirar conclusões da informação que vemos divulgada. Sem querer entrar em pormenores, reparem que apenas um ensaio clínico aleatorizado pode tirar conclusões sobre causalidade ou eficácia de um medicamento. Pelo contrário, um estudo observacional pode mostrar uma associação, mas não permite tirar conclusões de causa-efeito ou eficácia.
Por exemplo,
um estudo observacional pode demonstrar uma associação entre uma “maior
ingestão de gelados” e um “maior nº de afogamentos”. Porém, não podemos
concluir que ingerir mais gelados provoca mais afogamentos (neste caso, uma
explicação mais plausível é que no Verão comemos mais gelados e que nesta
estação do ano também vamos mais à praia, nadamos mais e, consequentemente, há
mais probabilidade de afogamentos). Da mesma forma, um estudo observacional
até pode demonstrar uma associação entre a suplementação com vitamina D
e diminuição da doença x. No
entanto, não podemos concluir que a
vitamina D causou essa diminuição. Neste caso, a vitamina D pode ser
apenas um marcador de estilos de vida
mais saudáveis. Por exemplo, possivelmente, quem escolhe tomar suplementos
desta vitamina, também se preocupa em comer de forma mais saudável e fazer mais
exercício físico. Com base em estudos observacionais não conseguimos assegurar que é a vitamina D a responsável pelo
efeito benéfico observado e não os outros fatores do estilo de vida dessas
pessoas.
Posto isto, até ao momento, muitos dos estudos divulgados que demonstram “os benefícios” da vitamina D em diferentes contextos foram estudos observacionais e compararam pessoas que decidiram por si tomar estes suplementos com aqueles que não tomaram.
Felizmente, em Novembro de 2018 publicaram no New England Journal of Medicine os resultados do primeiro grande ensaio clinico aleatorizado controlado com placebo (estudo VITAL) que seguiu 25 871 indivíduos (com mais de 50 anos) durante uma média de 5 anos. Com base nos resultados deste ensaio, aprendemos que:
Altas doses de vitamina D não diminuem o risco de desenvolver cancro ou doença cardiovascular
(AVC, enfarte agudo miocárdio) na população geral de homens e mulheres
saudáveis.
Aparentemente, pode reduzir a mortalidade por
cancro, mas ainda precisamos de mais estudos para confirmar esses resultados.
A dose de 2000 IU/ dia é bem tolerada com poucos
efeitos adversos (níveis de cálcio elevados no sangue, pedras nos rins e
sintomas gastrointestinais) na população saudável. Ainda assim, algumas pessoas
(especialmente as que têm doença renal, pedras nos rins, níveis de cálcio
elevados no sangue, doença gastrointestinal ou risco de doença cardíaca devem
procurar aconselhamento médico antes de iniciar estes suplementos.
Os resultados não apoiam a iniciação de vitamina D em altas doses para aprevenção de cancro ou doença cardiovascular em indivíduos
saudáveis que já cumprem os requisitos de vitamina D para manter a saúde óssea.
Em relação a outras
patologias, revendo a melhor evidência científica disponível atualmente, não é possível estabelecer uma
relação de causalidade entre baixos níveis de vitamina D (25(OH)D3) no sangue e
doenças como: esclerose múltipla, diabetes mellitus tipo 2, depressão, cansaço,
sintomas de doença respiratória, infecções, osteoartrose ou dor crónica.
Conclusões:
Toda a população deve manter níveis de vitamina D adequados (por exemplo, através da ingestão de alimentos ricos em vitamina D e da exposição solar moderada).
Com base na
melhor evidência disponível, parece que a suplementação com vitamina D por
rotina não prolonga a vidanem diminui a incidência de cancro, doenças
cardiovasculares, diabetes mellitus tipo 2ou fraturas ósseas em pessoas que não apresentam alto risco de
fraturas.Além disso, a
suplementação de vitamina D não
mostrou benefícios no tratamento da depressão, cansaço, sintomas de doença
respiratória, infecções, esclerose múltipla, osteoartrose ou dor crónica.
Portanto, com
base no que sabemos hoje, não se recomenda
a suplementação ou rastreio dos níveis de vitamina D com fins
preventivos para a população saudável em geral.
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Este é um dos mitos que apesar de já ter sido “desmistificado” por várias pessoas, vale sempre a pena abordar. Quem nunca teve de aquecer comida e se perguntou “será que aquecer no microondas faz mal”? Desde ideias sobre radiação na comida, a perda de nutrientes, à diferença entre usar vidro ou plástico, hoje o plano é esclarecer algumas destas dúvidas. Para quem não quer saber detalhes e apenas procura um resumo prático, aconselho a lerem a conclusão 🙂
Como funcionam os microondas?
Primeiro, é importante perceber que o efeito da radiação na cozedura é um processo altamente complexo e, por isso, todos os estudos que abordam este tema também o são.
De forma simples, os microondas cozinham a comida através de ondas de energia. São ondas altamente seletivas e que afetam primariamente a água e outras moléculas, fazendo com que estas vibrem “umas contra as outras” e assim gerem energia em forma de calor.
Mito: Os microondas emitem radiações que nos podem fazer mal.
Segundo a evidência atual, os microondas são seguros e não há estudos que comprovem qualquer associação entre este electrodoméstico e doenças, quando usados da forma correcta. A radiação dos microondas (radiação não ionizante) aquece moléculas de água da comida mas não têm energia suficiente para quebrar ligações moleculares. Portanto, a menos que nos coloquemos dentro do microondas (enquanto funciona), essa radiação não nos atinge. Um artigo escrito na Science Based Medicine sugere apenas não usar microondas antigos e que não funcionem bem, assim como evitar estar directamente em frente ao microondas quando este está a funcionar (se quiserem ser extremamente cautelosos).
Mito: Os alimentos perdem mais nutrientes quando são cozinhados no microondas.
É um facto que alguns nutrientes são perdidos quando expostos ao calor. Contudo, isto aplica-se a qualquer fonte de calor, seja ela por cozedura em água, calor de forno ou de microondas. Um estudoque analisou os vários tipos de cozedura concluiu que os métodos que preservam mais nutrientes incluem grelhados, assados e cozinhados no microondas, ao contrário dos cozidos em água ou em panela de pressão, que aparentemente apresentavam maior perda de nutrientes. Isto faz sentido se pensarmos que, no caso do microondas, o processo de cozedura é bastante mais rápido, e a exposição ao calor não é tão longa. Para além disto, sabemos que quando os alimentos são cozinhados em água muitos dos micronutrientes acabam por passar para a água. Notem que noutros alimentos, a exposição ao calor pode aumentar a presença de um determinado nutriente, como o licopeno dos tomates e os carotenóides nas cenouras.
Verdade: Aquecer em recipientes de plástico pode libertar substâncias potencialmente nocivas.
Primeiro: depende do que está no plástico. Muitas vezes são adicionadas substâncias (como bisfenol-A, mais conhecido como BPA) ao plástico para melhorar a sua aparência e durabilidade. É verdade que algumas dessas substâncias, nomeadamente os BPA, são considerados “desreguladores endócrinos” (substâncias capazes de se ligarem a receptores hormonais no nosso organismo), e que, quando os plásticos são aquecidos em contacto com os alimentos podem libertar estas substâncias para os alimentos. Isto acontece mais com alimentos com maior teor de gordura (como carnes e queijos gordos). A FDA também sugere que pode haver outras substâncias mais pequenas que migram do plástico para a comida. Alguns recipientes “microwave safe” podem de facto ser mais seguros, ainda assim, nenhum será mais seguro que um recipiente de vidro. Neste sentido, faz sentido que de facto não se usem recipientes de plástico para aquecer comida no microondas (para além do plástico ser muito menos ecológico do que os recipientes de vidro).
Pessoalmente, não é a minha forma preferida de cozinhar a comida, acho que os sabores não ficam os mesmos. Mas é uma óptima forma de aquecer alimentos ou refeições que tenhamos preparado no dia anterior. Mas aqui vai o resumo do que descobrimos:
Conclusão
Relativamente à segurança: O microondas é seguro quando usado para aquecer ou confecionar comida em recipientes de vidro ou cerâmica. Apesar de já haver muitos recipientes de plástico adequados para aquecimento no microondas, alguns levantam a preocupação de migração de substâncias nocivas ou desreguladores endócrinos e, na dúvida, devem ser evitados. Basta colocarem num prato antes de levar ao microondas!
Relativamente aos nutrientes: não há perda significativa de micronutrientes comparativamente a outros métodos de confeção.
Como em qualquer situação, há que ter bom senso. Estarmos infinitamente preocupados com radiação do microondas mas depois estarmos 3 horas expostos ao sol na hora de maior calor ou fumarmos 10 cigarros por dia. É contraditório. Um estilo de vida saudável têm por base os hábitos que temos 80 a 90% do tempo, e como tal, se forem equilibrados e evitarem de forma geral a exposição a químicos e radiações, o risco de terem problemas será sempre menor.